ATENDIMENTO NA ÁREA DA SAÚDE E A LEI DO DESACATO
Se nas paredes forem encontrados os tais cartazes, certamente o modelo de acolhimento que predomina é ainda do antigo INAMPS, nada próximo do que preconiza o modelo SUS focado na humanização do atendimento.
Os cartazes representam emblematicamente o “foco” de organização do sistema: facilitar a vida de quem atende, ao invés de facilitar a vida de quem vai ser atendido: o usuário!
Ou seja, ao se colocar tais cartazes alguém partiu do suposto de que 99% dos usuários não tem o perfil de quem adota condutas agressivas de desacato verbal ou física. No entanto, todas as pessoas de “bem” que acessam as dependências de uma Unidade de Saúde e se defrontam com tais avisos, se “sentem” diminuídas, decepcionadas, e terminam por manifestar suas ansiedades no momento que não são respeitadas como cidadão com direitos e deveres.
O fato é que o Modelo Assistencial do antigo INAMPS ainda predomina em muitos dos Municípios desse pais. Evoluímos em tecnologia de diagnóstico e terapias. Saímos da invenção do Raio X em 1923 para o Tomógrafo Computadorizado nos dias de hoje, mas na área do atendimento continuamos, quem sabe por comodidade, mantendo o foco em quem vai atender, ao invés de manter o foco em quem vai ser atendido. Muitos de nós, profissionais de saúde, nos esquecemos de atitudes humanistas básicas, aliás, só nos lembramos delas quando é para exigir atendimento para si ou para alguém da própria família.
Apesar de vivermos no século 21, ainda fazemos muita confusão entre do que vem a ser “desacato” e uma “reclamação”.
Obviamente que muitos servidores da saúde, especialmente os dotados de “espírito de solidariedade” atendem com educação, respeito e humanidade, demonstrando que não é uma categoria de profissionais que tem problemas comportamentais. Infelizmente restam alguns seres humanos que não tem capacidade mental para compreender o principio básico da “ação x reação”, contribuindo para jogar na vala comum do desgaste público toda uma categoria.
Claro que também precisamos ser rigorosos com os Usuários que nos ofendem e nos desrespeitam como pessoas e profissionais. Mas estes precisam ser tratados nos termos da lei. Neste caso o Gestor precisa assumir a defesa da rede fazendo valer os mecanismos policiais e de controle social, transferindo a solução do problema, por exemplo para o Conselho Municipal de Saúde.
O fato é, que muitas vezes quando o usuário reclama de desatenção, indelicadeza ou por qualquer outro motivo, ele acaba prontamente sendo advertido por alguém, sobre a lei de desacato , ora, reclamar não é desacato, é um direito.
No contraponto da Lei do Desacato, poderíamos chamar atenção para o art. 138 do Código Penal que trata da “calúnia” contra alguém, imputando-lhe falsamente algum fato ou crime, assim como Art. 139 que trata da “difamação” quando alguém imputa a um terceiro algum fato ofensivo à sua reputação. E se os Usuários começarem também a usar desses dispositivos legais para verem seus direitos atendidos?
Na maior parte das vezes, quando os usuários são acusados de desacato, estavam apenas reclamando de algum eventual descaso e desatenção. Isto poderia ser enquadrado como calúnia e difamação!
Enfim, a constatação é real! O Sistema Único de Saúde, ainda permanece organizado para facilitar a vida de si mesmo. A grande maioria dos problemas relacionados ao SUS, estão relacionados a uma questão de atitudes e relacionamentos e uma outra boa quantidade de situações relacionadas a falta de profissionalização da gestão.
O mais importante é que precisamos definitivamente caminhar na direção de fazer desaparecer do cenário o modelo excludente do INAMPS e fazer valer, pelo menos na questão dos relacionamentos o modelo universal e humanitário do SUS. Vamos tirar os cartazes inconvenientes das paredes das Unidades e no lugar deles fazer educação em saúde, com informações que eduquem o usuário no uso correto do SUS!
Norival R Silva
Fevereiro 2012